A emergência do novo coronavírus veio acompanhada da necessidade de realização de uma ampla e constante quantidade de testes para identificar a presença do vírus Sars-CoV-2 em amostras de casos suspeitos. Tendo em vista esse cenário de urgência, pesquisadores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), em parceria com a Fiocruz Ceará e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), buscaram uma alternativa mais econômica para diagnosticar a Covid-19 dentro do padrão já adotado pelo Sistema Único de Saúde (SUS), proporcionando, assim, uma maior acessibilidade para laboratórios e instituições com orçamentos mais restritos.
Conhecida como High Resolution Melting (HRM), a análise é baseada na curva de dissociação de alta resolução na plataforma de Reação em Cadeia da Polimerase em Tempo Real (RT-PCR). O que torna essa técnica mais vantajosa do que o método convencional é a presença de uma química produtora de fluorescência na mistura de reação utilizada na RT-PCR, dispensando o uso de sondas fluorescentes – que possuem um alto custo – como terceiro elemento.
“Desde o início de 2020, a detecção molecular do Sars-CoV-2 para o diagnóstico da Covid-19 é realizada por técnicas convencionais na plataforma RT-PCR, como indicou a Organização Mundial da Saúde [OMS]. Esses modelos, considerados padrão-ouro, ou seja, padrões de referência, fazem uso de iniciadores (primers) e sondas fluorescentes para a identificação do genoma do vírus. No entanto, nosso estudo comprova que há um modo alternativo de alcançar o mesmo resultado na plataforma sem a necessidade do uso de sondas, o que torna esse processo mais econômico, com um custo abaixo de 20 reais por amostra, para a etapa da PCR”, explicou o pesquisador do Laboratório de Biologia Molecular e Doenças Endêmicas do IOC e coordenador do projeto, Otacílio Moreira.
Diversos testes foram realizados até a comprovação da eficácia da técnica de HRM. Inicialmente, foram analisados os primers listados pela literatura científica e recomendados pela OMS. Em seguida, os pesquisadores passaram a desenvolver a reação em diferentes formatos. A metodologia, então, passou por uma validação analítica com padrões sintéticos, testando se o método é adequado ao fim a que se destina, e uma validação clínica com amostras reais de pacientes com Covid-19.
Os resultados apresentaram taxas elevadas de sensibilidade e especificidade na detecção do Sars-CoV-2, equivalentes aos números do modelo convencional com o uso de sondas TaqMan, considerado padrão-ouro para Covid-19. Foram testadas, principalmente, amostras coletadas por swab na região da nasofaringe, além de soro (sangue) e saliva, para analisar a capacidade do teste em amostras com menor índice de carga viral.
“A intenção não é substituir as metodologias já existentes, mas oferecer um suporte. Nossa proposta é entregar uma técnica mais barata e com a mesma performance do padrão-ouro TaqMan para grupos de pesquisa que necessitam baratear seus custos. Hoje virou uma realidade fazer testes que precisam de RT-PCR para atividades cotidianas, como pegar um avião, ou entrar em um estádio de futebol. Então, ter uma metodologia alternativa é estratégico, principalmente, uma mais barata que possibilite a ampliação da testagem”, pontuou o coordenador, que é responsável pela Plataforma de PCR em Tempo Real RPT09A, onde o projeto foi executado.
No IOC, também participaram do estudo os Laboratórios de Desenvolvimento Tecnológico em Virologia, de Hepatites Virais e de Virologia Molecular. O artigo atualmente está disponível em pré-print e submetido à revista científica PLoS One. A iniciativa é financiada pelo edital Inova Resposta Rápida Covid-19 da Fiocruz. O projeto integra a Vitrine Tecnológica sobre Coronavírus do IOC.
Nova etapa: identificação de variantes
Com a validação da metodologia de High Resolution Melting para o diagnóstico da Covid-19, mostrando sensibilidade equivalente ao padrão-ouro, os pesquisadores avançam para uma nova etapa. Devido a preocupação provocada pelas variantes do Sars-CoV-2, o projeto foi ampliado e atualmente o grupo investiga se a técnica é eficaz também na identificação das alterações no vírus.
“Nos ensaios de HRM você não apenas consegue detectar a presença do seu alvo, como qualquer diferença nela provocará uma alteração na temperatura de melting. Antes, nós trabalhávamos em regiões do vírus que não sofriam tantas pressões para mutação, e, por isso, são áreas importantes para o diagnóstico. Agora, mudamos o foco e estamos vendo regiões que costumam sofrer alterações, e que são usadas para discriminar as variantes”, pontuou Otacílio.
De acordo com o coordenador da iniciativa, a técnica alternativa, agora direcionada para genotipagem, manterá a vantagem financeira quando comparada a outras tecnologias. “Ainda estamos buscando financiamento para essa nova fase do projeto. Porém, já demos início a adaptação do ensaio de HRM para além do diagnostico. Quando o projeto foi iniciado, lá no início da pandemia, ainda não havia esse cenário de variantes. Assim que elas se tornaram uma questão de emergência de saúde pública, já tomamos a atualização desse estudo como uma nova etapa após sua validação como diagnóstico”, afirmou o especialista.
Fonte: Agência Fiocruz de Notícias