Perda de memória e dificuldade de manter a atenção são queixas frequentes durante e depois da covid-19.
À medida que o quadro clínico da doença se tornou mais conhecido, ficou evidente que o atual coronavírus é responsável por esses e outros efeitos deletérios no tecido cerebral, com duração eventualmente prolongada. Um artigo recém-publicado na revista “JAMA” mostrou que 80% dos pacientes hospitalizados apresentam sintomas neurológicos.
Estudos recentes têm demonstrado que o comprometimento do sistema nervoso central se deve a três mecanismos principais:
1) Agressão direta do vírus
Há evidências ainda não publicadas, de que chega a ocorrer perda de massa cinzenta em diversas áreas do cérebro.
Hoje, sabemos que a barreira de defesa existente entre o sangue e o líquor (barreira hemoliquórica) dificulta a passagem do vírus da corrente sanguínea para o tecido cerebral, impedindo o ataque direto aos neurônios.
Nos últimos meses, surgiram várias publicações sobre a presença de autoanticorpos no sangue de pessoas infectadas, capazes de se ligar e agredir os neurônios, por ação direta.
O acesso ao sistema nervoso central parece ocorrer através da mucosa nasal, que faz fronteira com o cérebro. Por essa via, são infectados os astrócitos, células que exercem inúmeras funções, entre as quais a de dar suporte e oferecer nutrientes aos neurônios.
A infecção dos astrócitos explica o aparecimento de alguns dos sintomas: fadiga, depressão e o “nevoeiro cerebral”, caracterizado pelas queixas de confusão mental e de “esquecimentos”.
2) Redução do fluxo sanguíneo
Há evidências de que as células cerebrais podem ser afetadas pela redução do volume de sangue que chega até elas.
Num estudo publicado em abril deste ano (2021), pesquisadores do University College London demonstraram que o vírus interfere com o comportamento dos pericitos (células encontradas em pequenos capilares que irrigam todos os tecidos do corpo). A ação se daria pela ação direta do vírus nos receptores existentes nas membranas externas dessas células, provocando a constrição dos capilares, com consequente redução do aporte sanguíneo ao tecido nervoso.
Esse mecanismo, que simula microacidentes vasculares cerebrais, explicaria os casos de sintomatologia neurológica de longa duração, pós-covid.
3) Disfunção imunológica
Alguns dos sintomas e das alterações neurológicas podem ocorrer pela formação de autoanticorpos (anticorpos produzidos pela infecção, que se dirigem contra os tecidos saudáveis do organismo).
Nos últimos meses, surgiram várias publicações sobre a presença de autoanticorpos no sangue de pessoas infectadas, capazes de se ligar e agredir os neurônios, por ação direta.
Esses mecanismos não são mutuamente exclusivos. É possível que o Sars-CoV-2 desorganize a função dos astrócitos por ação direta ou indireta, ao mesmo tempo em que provoque vasoconstrição dos capilares cerebrais e a produção de autoanticorpos que atacam neurônios.
Embora a prevalência de comprometimento neurológico seja mais alta nos pacientes que estiveram internados, muitos casos ocorrem em pessoas que apresentaram formas leves ou moderadas da doença.
Fonte: Portal Drauzio Varella